quinta-feira, 29 de abril de 2021

Saga de professora - Parte I

 

Saga de professora

Parte I

 

 

No quesito “invencionice”, o brasileiro é mesmo insuperável!

Hoje, fui apanhada pela descoberta de um fonema, até então, oculto na língua lusitana, mais conhecida como “A última flor do Lácio”, em sua vesão américo-brasiliense, que é o fonema “fh”. Isso, mesmo: “fh”, que eu, na minha santa ignorância, pretensamente acadêmica, não atentei à possibilidade de existência.

Explico: uma mãe me liga, desesperada, porque o nome da filha é grafado com “f” e não com “p”, como eu registrara, pensando tratar-se de um arcaísmo, devidamente seguido pelo “h”. Como não concordo, mesmo com essas complicações, agradeci, pela observação e fiz a correção, pensando, desta forma, estar mais ajustada, a ortografia do referido nome, às nossas normas linguísticas.  Nova ligação, mais desesperada: “Não é ‘f simplinho, assim’! O nome da minha filha é com ‘fh’!”

Já não bastassem todas as confusões com o nome, que já faço, por conta das possibilidades de ser grafado com ph, f, th, nn, nny, nie, ainda me aparece mais esta!

Por que os pais não registram mais suas meninas com o belo nome de “Estefânia”, devidamente acentuado, por se tratar de uma paroxítona terminada em ditongo crescente? Ou por seu correspondente abrasileirado do inglês, Estéfane, uma bela proparoxítona que nos dá gosto de acentuar e pronunciar? Só para complicar as vidas dos pobres professores alfabetizadores, que se verão impossibilitados de recorrer à estratégia de ensino da leitura e escrita a partir do nome da criança, por não terem como explicar à pobre criança as formações silábicas de nossa língua a partir do nome de seu aluno?

Vale a pena esse “diferencial” todo?

E o pobre do “Wanderceidson”, que tão bem poderia ser chamado de “Vander filho da Cleide”, com mais sonoridade e inteligibilidade?

Já estou com medo das próximas listas de chamadas, com os futuros “Covidson”, “Ifanielson/Ifaniele/Ifaniete”, as gêmeas “Clora” e “Quina”, e, por aí, vai...

Venha logo, aposentadoria, que quero lhe usar, antes de ensandecer!

Vanda Felix




segunda-feira, 19 de abril de 2021

Ponto


 

Nosso ponto 

De encontro 

Hoje é um ponto 

De interrogação. 

Depois de tanto desacerto, 

Desencontro, 

Desconcerto 

E desperdício 

De tempo,

Não há tempo 

Para encontros. 

Meus cabelos 

Já estão brancos 

E meus olhos turvos 

Pelo sono. 



Já não durmo, 

Já não penso, 

Já não sonho, 

Já não amo. 

Não há tempo, 

Não há clima. 


 Já não sou 

Mais tão menina, 

Nem senhora 

Dos meus rumos. 

Sou alma solta no vento, 

Sem assento, 

Sem destino. 



Sinto o passar dos anos, 

Sinto o peso 

Do meu tempo. 

Dói na alma 

A lembrança 

Da criança 

Que sonhava, 

Mas não pode 

Viver o sonho. 



Perdeu a parada, 

Perdeu o ponto... 

Perdeu o encanto 

Pela vida 

Que podia 

 Ter vivido. 



Se perdeu 

Num labirinto 

 De enganos 

 E ilusões. 

Ponto cego. 

Ponto morto. 

Mar revolto 

Foi seu destino. 



Longe do porto, 

Sem carinho, 

Sem conforto...

Vanda Felix

terça-feira, 6 de abril de 2021

Dona Esperança

 "Nossas vidas começam a terminar no dia em que permanecermos em silêncio sobre as coisas que importam" 

Martin Luther king



Um balde d'água fria na face

da tal da Dona Esperança. 

Uma mudança

de amor

e de humor.

Bem-me-quer,

mal-me-quer.

Quem sabe o que você quer?

Um sobe e desce,

uma dança. 

Sem rotina,

sem constância.

Sobe e desce,

some e aparece.

Quem é?

Quem foi?

Quem será?

Quem, agora, o sabe?

Memórias que lhe escapam,

fugitivas,

histórias esquecidas,

uma vida.

Hoje, sombra de sua existência. 

Espelhos que não refletem 

a luz de sua presença. 

Dona Esperança...

Em que dedo repousa

sua dourada aliança?

Dia e noite se confundem,

horas se fundem

sem a marcação dos dias.

O tempo é um engodo, 

um pobre louco sentado

na praça 

a falar com os passarinhos...

A memória, 

hoje, gaveta trancada

a sete chaves.

Pra onde foi Dona Esperança?

Quis voltar a ser criança, 

mas, já,  sem tanta energia

para comigo brincar. 

Sem história,

sem memória, 

sem riso alegre, 

sem graça...

A vida passa,

simplesmente por passar...

Vanda Felix.




sábado, 3 de abril de 2021

Teus desejos são meus cantos

Há um canto 

Que me encanta, 

Me acalenta 

E me desarma. 

Há um canto, 

Tão melódico, 

Tão suave,

Que me acalma 

E apazigua a louca alma. 

Esse canto 

Que me encanta, 

E me seca 

O pranto doído, 

Me joga ao solo 

E me levanta. 

Esse canto 

Eu mesma canto, 

 Assovio 

 Mentalmente. 

 Vem de dentro, 

Vem do peito, 

Desafina,

Não tem jeito...

Me embala o sono, 

Me desperta, 

Me deixa esperta, 

Me inspira. 


Não é canto 

De sereia, 

Nem de banda 

Tão famosa. 

É o canto dos teus olhos 

Que me olham 

De soslaio. 

Me despem 

Por inteiro, 

Me deixa em pelo 

Entregue aos vícios

E desejos teus 

Que também são  

Os meus desejos... 

Teus desejos 

São meus cantos 

Que gorjeio em desafino 

A cada raiar de dia, 

A cada por do sol, 

A cada quarto de lua 🌓 

Na contagem 

 Dos meus dias.

Vanda Felix 





quinta-feira, 1 de abril de 2021

Do alto

Do alto da torre

Do mais alto prédio 

Do alto da colina, 

Um casal de gaviões 

Observa o não movimento

Das ruas paradas...

Que lhes vem ao pensamento?

Haverá estranheza em seus olhares? 


Tempo quente 

Almas frias.

UTIs lotadas

Ruas vazias...

Distância de toda gente

Falta de companhia.

Gaviões,  talvez não saibam

De nosso inimigo invisível. 


Tempos estranhos,

Tempos sinistros. 

Meu país do futuro

Não preserva seu presente.


Tateamos no escuro

As paredes de um quarto vazio.

Tropeçamos no nada,

Caímos num buraco profundo,

Onde, embora não tenha fundo, 

Iremos nos esborrachar.


Não se faz o que deve ser feito 

Para mudar triste destino.

Deixamos morrer nossos sonhos

E os sonhos mais pueris

De nossas meninas e meninos.


De uma existência incerta,

Não estamos certos de mais nada.

Pobres humanos!

Somos uma raça perdida

Prestes a ser dizimada.


E, do alto da mais alta torre,

Do mais alto prédio, 

Da mais alta colina 

Gaviões e urubus nos observam

Perplexos

De nosso fracasso como espécie.

Vanda Felix




Retomada

 Há tempos não percorria estas páginas... deu até saudade, agora! É que a vida anda tão atribulada, tão conturbada, que meus hábitos mais re...